A inglesa Gillian Green ouviu a dica de um colega: "Dá uma olhada nesta história".
Matéria publicada na Folha
Diretora
de ficção de um selo comercial na Random House britânica, com a meta de
lançar 35 potenciais sucessos ao ano, ela tende a receber mais dicas do
que pode administrar -o site da editora, a maior do mundo, diz que
menos de 1% dos originais não solicitados são publicados. Aquela foi uma
ocasião em que se sentiu impelida a ir atrás. As circunstâncias
favoreciam. A tal história, "The Lost Boys", era a mais
lida do Wattpad, misto de rede social e site de autopublicação que
ainda não emplacou no Brasil, mas que no exterior é chamado de "YouTube
do texto".
A
escritora paulistana Lilian Carmine Iniciada no começo de 2010, a
trama, escrita em inglês e assinada por Lilian Carmine, logo se destacou
entre os 10 milhões de narrativas em série do site canadense, postadas
e/ou lidas por 14 milhões de usuários. No fim de 2012, quando Gillian
leu "The Lost Boys" no Wattpad, o site sinalizava 32 milhões de
visualizações para os 49 capítulos do livro, postados cada um em uma
página, ou uma média de 650 mil leituras da história inteira.
Por
bem menos que isso –15 milhões de visualizações–, a americana Brittany
Geragotelis tivera seu "Life's a Witch" contratado pela Simon &
Schuster, outra das maiores editoras do mundo. Lilian Carmine narrava a
história de Joe, garota que conhece um rapaz, Tristan –na verdade, um
fantasma, algo de que ela não desconfia, embora ele nunca saia do
cemitério. Esse era só o início, e Gillian Green ficou, segundo lembra,
"apaixonada".
PSEUDÔNIMO
Quando
pensou em assinar como Lilian Carmine, a paulistana Bruna Brito, 35,
tinha duas coisas em mente. A primeira era que o pseudônimo a deixaria à
vontade, sem que conhecidos soubessem que ela escrevia romances juvenis
na internet. Formada em artes visuais, ela já tinha certo nome como
ilustradora e trabalhava para editoras como a Saraiva. A outra era que
não haveria nativo de língua inglesa capaz de driblar os bês e erres de
seu nome. Já que escreveria em inglês, sem nunca ter morado fora nem
estudado mais que o "to be" na Cultura Inglesa, era bom evitar o
trava-língua entre leitores. Lilian aprendeu o idioma por conta própria,
diz, vendo séries e lendo –a obra completa de Terry Pratchett, todo o
"Harry Potter", muito Neil Gaiman.
Em
"The Lost Boys", usa gírias e faz gracinhas, sem a dureza de quem
escreve numa segunda língua. Joe e o fantasma Tristan são só uma ponta
da trama, que inclui romance, fantasia e uma banda de rock. "Vou jogando
estereótipos e desmontando-os. As meninas estão acostumadas com certos
arquétipos e se surpreendem", diz Lilian, no prédio onde mora com o
marido, na zona oeste de São Paulo. Ela conta que começou a escrever em
inglês porque "queria ser lida". No Brasil, apesar de já trabalhar para
editoras, cansou de esbarrar em negativas. Tem uma gaveta cheia de
infantis inéditos.
'MEU DEUS!'No final de outubro, Gillian escreveu para Lilian: "Adorei seu livro. Pode passar aqui na editora para conversarmos?". Lilian, incrédula, respondeu: "Fico felicíssima, mas vai ser meio difícil passar aí: eu moro no Brasil". A editora acha graça em não ter notado pequenos detalhes "estrangeiros" que agora reconhece no texto: "Estava tão envolvida que não notei. Em sites assim, são naturais probleminhas de texto, nada que chamasse a atenção.
Quando
ela falou que era do Brasil, pensei: 'Meu Deus!'". O contrato para uma
trilogia foi assinado em novembro passado –o segundo livro, postado a
partir de 2011, chegou a ter 1,4 milhão de visualizações antes de ser
retirado do ar a pedido da editora. Do primeiro, ficou no ar um
aperitivo de seis capítulos.
Para
não frustrar quem aguardava o terceiro livro, iniciou no site uma
história paralela com os mesmos personagens. "The Lost Boys 1" sairá em
setembro pela Ebury Press, que, na intrincada rede que abarca 19 países,
é o maior selo de uma das cinco divisões do Random House Group, o braço
britânico da americana Random House Inc.
O
gênero é "new adult", invenção recente do mercado editorial. Visa um
público entre os 15 e os 30 e poucos anos, com a exclusão da denominação
"juvenil". "É mais maduro e provocativo que 'Crepúsculo', que é 'young
adult'", explica a editora. Antes mesmo de ter o livro pronto e de
definir sua tiragem no Reino Unido, a Random House já vendeu direitos
para Itália, Portugal e Brasil.
Quem
levou aqui foi a LeYa. "Comprei assim que soube, antes que entrasse em
leilão", diz a publisher Maria João Costa. A versão nacional, também
prevista para setembro, não será traduzida pela autora, que estará
escrevendo o fim da trilogia. Lilian diz não ter recebido nenhuma
proposta milionária, mas, com os adiantamentos e uma limpa na poupança,
pretende passar um ano com o marido no exterior a partir de maio. Embora
escreva bem, sente-se travada para falar em inglês. Quer estar afiada
para poder dar entrevistas quando chegar a hora.
TRECHO
"Eu estava perdida. Eu era realmente uma garota perdida.
Estive
andando nesse velho cemitério, completamente perdida, por cerca de 20
minutos agora, tentando encontrar a saída, mas cada vez que pensava
estar chegando perto, me encontrava mais longe e fundo nesse velho
cemitério. Quanto mais longe ia, mais envelhecido tudo se parecia.
Estátuas se tornavam mais decadentes e caindo aos pedaços, grama
acinzentada e ressecada tomava conta de rachaduras no chão, túmulos com
cada vez mais musgo e mais descuidados.
Um
pouco de neve caíra perto das lápides, mas as alamedas estavam limpas e
livres para andar. Eu estava seriamente tentada a começar a gritar a
qualquer momento agora, como uma criança patética que se perdeu da mãe.
Eu podia sentir o constrangimento esquentando minhas bochechas só de
pensar. E tudo isso começou comigo e com minhas boas intenções."
Eu não acreditooooooooo!!! Isso é tão legal a verdade infelizmente é que o mercado aqui ainda tah fraco para escritores brasileiros, e o povo prefere o que vem de fora, mas a coisa é que se vc publicar um livro em inglês o campo é muito maior. Super apoiada a atitude dela e eu acho que mais escritores daqui deveria fazer isso, pelo menos até notarem os autores brasileiros, tem muita gente boa pô!!! u.u
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