6.4.18

[Resenha #1599] Antes de Tudo Acabar - Mary C. Müller @PlanetaLivrosBR


Antes de Tudo Acabar
Mary C. Müller
ISBN-13: 9788542212082
ISBN-10: 8542212088
Ano: 2017
Páginas: 256
Idioma: português 
Editora: Outro Planeta
Skoob
Classificação: 5 estrelas
Compre: Amazon
Sinopse: Rafael nunca foi de se encaixar em padrões. Deslocado e sem muita perspectiva de vida, ele cuida da mãe alcoólatra enquanto precisa lidar com a paixão platônica pela melhor amiga, Anne, e com os percalços causados por um pai ausente. Acostumado desde sempre a fazer tudo com Anne, ele agora tem de aceitar que ela arrumou um namorado... e justo uma das últimas pessoas que ele gostaria de ver com a amiga. Como se não bastasse, ele também precisa se entender com o pai, que resolveu voltar a procurá-lo com uma surpresa: a filha que teve com a amante. E, em meio a esse turbilhão de acontecimentos, chega Kaori, a nova aluna da turma. Com ela, as coisas começam a mudar na vida de Rafael, e o que era só amizade pode acabar se tornando algo mais.Antes de tudo acabar é a história de um garoto que precisa se encontrar e compreender um mundo que se move mais rápido do que ele consegue acompanhar. Um mundo onde amizades são construídas e desfeitas, amores morrem e nascem e caminhos sofrem desvios inesperados.


Resenha:

Se você está vivendo ou já viveu uma adolescência repleta de perguntas sem respostas, com aquela constante sensação de não saber qual caminho escolher e a necessidade de se encontrar, o livro Antes de Tudo Acabar, da autora Mary C. Müller, foi escrito especialmente para você. 

“Chamarem você de algo que você gosta ou respeita seria um insulto em que mundo? Eu sentia algo parecido quando me chamavam de gay. E se eu fosse? Não era uma ofensa válida, não era um motivo de vergonha.” (pág. 19)
“Aquele monte de jovens que sorriam como se a vida fosse maravilhosa, com seus drinks caros e roupas de marca, completamente despreocupados, sem ter um pingo da noção do valor das coisas, bebendo até cair como se isso fosse legal.” (pág. 43)
“Eu preferia ficar com a minha Coca-Cola, meu Toddy e minha Fanta Uva, e que se danasse o que os outros achavam. O constrangimento de pedir suco em um bar quando estava todo mundo bebendo não se comparava à vergonha de correr pela praia gritando.” (pág. 63)
“Falar mal de alguém em comum. Aí estava algo que unia as pessoas.” (pág. 67)
A história se passa no município de Balneário Camboriú, em Santa Catarina (Brasil), onde somos apresentados ao nosso personagem principal, o Rafael. Ele tem 17 anos, está no último ano do Ensino Médio e vive intensamente todos os dias ao lado da melhor amiga, a Anne. E, se já não bastassem as dúvidas referentes ao futuro, os dois melhores amigos também têm os seus próprios problemas. 



“Eu não me matava porque tinha uma mãe para cuidar, uma amiga com paciência para me ouvir e um amigo que me entendia. Podia parecer pouco, mas bastava para mim.” (pág. 80)
“Era triste imaginar uma rotina toda baseada no fingimento, todos agindo como se estivesse tudo okay e normal. Todas aquelas máscaras de Coringa, cheias de sorrisos, quando por dentro não aceitavam a forma como as coisas eram.” (pág. 95)
“As pessoas à minha volta desdenhavam desse tipo de comportamento e me deixavam sem coragem de fazer nada. Hoje eu sei que estava doente. Ninguém zoa uma pessoa que está com gripe; por que faziam isso com quem tinha depressão?” (pág. 123)
“Esse negócio de “coisa de menino” e “coisa de menina” deveria ser extinto junto com os babacas com pensamento do século passado que propagam essas ideias.” (pág. 133)
“Eu tinha pouca convicção das coisas que queria ou não em minha vida, mas era engraçado como algumas certezas duravam tanto quanto uma foto de perfil no Facebook.” (pág. 153)
Infelizmente, Anne sofre agressões físicas e psicológicas do próprio pai. Apesar desse sofrimento diário, a personagem é descrita como uma garota forte. Enquanto isso, Rafa foi submetido a uma maturidade precoce quando o próprio pai abandonou a família. E, por conta desse acontecimento e anos de um relacionamento abusivo, sua mãe encontrou refúgio no álcool. Assim, para lidar com essa situação familiar, o bullying sofrido na escola e uma vida com depressão, Rafa encontra alívio na automutilação. No meio disso tudo, ele também começa a sentir algo a mais pela amiga. Mas o problema surge quando Anne conhece Michael, um garoto insuportável. 
“O sentimento de mudança em alguém mais velho devia ser algo difícil de engolir. Amigos para sempre que esqueciam um do outro no ano seguinte. O amor da vida que durava até o próximo verão. Ideias preestabelecidas que se transformavam completamente, distorcendo noções de realidade, de prazer, de certo e errado.” (pág. 179)
“O mundo podia ser muito melhor sem que nada precisasse mudar, desde que eu mesmo o visse com outros olhos.” (pág. 181)
“Não é errado a gente querer ser feliz. Não é errado a gente sentir que pertence a algum lugar.” (pág. 215)
“Queremos tanto fazer parte de um grupo e ser aceitos por ele que outras pessoas podem criar poder sobre nossas ações, se aproveitando da nossa instabilidade emocional ou coisa parecida. E como olhar para o lado e perceber que há algo errado em nosso relacionamento?” (pág. 226)
“Espero nunca perder essa capacidade de me maravilhar. De me divertir com tão pouco, aproveitar as coisas pequenas. De ter dúvidas e poder respondê-las com meu coração. De poder ser quem eu sou sem medo do que irão dizer.” (pág. 243)
Os personagens são muito bem construídos. Consegui encontrar profundidade em cada um deles, que desempenham papéis importantes para a vida do personagem principal e descrevem muito bem o que é ser adolescente. O Rafa tem a mente aberta, é livre de preconceitos, gosta de ficar sozinho e ao mesmo tempo se incomoda com a solidão. Ele não bebe, não fuma e raramente sai de casa. Tem esse gosto musical incrível por bandas de indie e rock e, apesar de parecer ser apenas mais um garoto na multidão, Rafa tem sua história e seu valor.

A Anne, apesar de ser bem contraditória no início, mostra-se o tipo de pessoa que usa uma máscara para esconder as próprias fraquezas. Descobrimos ao longo da leitura que muitas das suas atitudes surgem como consequências dos relacionamentos abusivos que permeiam sua vida. E a Kaori é a prova de que estereótipos são coisas de pessoas preguiçosas. Apesar da descendência, sua personagem deixa claro que não curte muito a cultura japonesa. Ela é doce, tímida e com o tempo se torna uma pessoa extremamente importante para a amizade do Rafa e da Anne. 


Temos também a presença do Ferreira, um personagem que traz para o livro a discussão sobre a sexualidade na adolescência. Seus pais são contra qualquer forma de diversidade e ele precisa sempre esconder o fato de que é homossexual dentro da própria casa. É dele uma das frases mais impactantes de todo o livro: “Minha sexualidade é o monstro que meus pais não querem que ninguém saiba que existe. Nem eles mesmos.” (pág. 98)

A escrita da autora é bem jovem e objetiva. Ela usa palavras de fácil entendimento, fala sobre assuntos que permeiam a juventude do século XXI e faz referências culturais, principalmente com relação ao mundo da música. Além disso, adorei a forma como ela acrescentou mensagens de texto em algumas partes do livro. Gosto muito quando os autores utilizam esse recurso, já que essa forma de comunicação está inserida diariamente no contexto em que vivemos e não pode ser ignorada. 

Por conta também da sua escrita imersiva, eu revivi as minhas próprias lembranças da escola, das pessoas que encontrei pelo caminho e marcaram a minha vida, das sensações que são sentidas apenas uma vez e de momentos que se perderam ou deixaram de existir. 


E não posso deixar de comentar sobre a ilustração de capa e parabenizar o ótimo trabalho da Editora Planeta do Brasil em tornar impresso essa narrativa. O trabalho realizado por André Stefanini e Adams Carvalho conseguiu transportar a essência dos personagens descritos pela autora. Anne foi fielmente ilustrada como uma garota com estilo despreocupado, de rosto delicado e cabelos desalinhados na altura dos ombros; o Rafa está exatamente como imaginei, a blusa de manga comprida cobrindo os pulsos, a calça skinny preta e o cabelo bagunçado; e, por fim, a doce Kaori, com o cabelo curtinho preto e a descendência japonesa explicita nos olhinhos amáveis. 

Por fim, Antes de Tudo Acabar é sobre viver intensamente essa fase da adolescência. “Antes de tudo acabar, a gente aprende a ser quem é.” (pág 243) É chorar, rir, errar, temer, abraçar e perdoar. Ser adolescente não é estar sempre perdido, é estar sempre tentando se encontrar. E é como o próprio Rafa diz: "A vida continuaria em frente, como ela sempre fez. Sem esperar, sem se importar, sem dar segundas chances. Mas nós sempre esperaríamos, nos importaríamos e daríamos segundas chances, terceiras e até quartas chances se fosse preciso.” (pág. 252)




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